Introdução
A compra de imóveis é um marco na vida de muitas pessoas, representando a concretização de sonhos e investimentos de longo prazo. No entanto, as complexidades jurídicas e financeiras desse processo nem sempre são claras para o comprador, especialmente quando se trata de despesas que surgem no momento da entrega das chaves. Um exemplo frequente é a cobrança da taxa de individualização das matrículas. Apesar de ser prática comum em alguns contratos, essa cobrança tem sido amplamente questionada nos tribunais, por seu potencial de lesar os direitos do consumidor. Este artigo explora a questão, analisando a base jurídica, precedentes judiciais e implicações para o mercado imobiliário.
O que é a Taxa de Individualização das Matrículas?
A taxa de individualização das matrículas refere-se ao custo relacionado à separação das unidades em um empreendimento imobiliário no Registro de Imóveis. Em termos simples, é o processo que transforma uma matrícula geral, do empreendimento como um todo, em matrículas individuais para cada unidade habitacional. Essa etapa é essencial para que o comprador possa registrar o imóvel em seu nome e, assim, exercer plenamente sua propriedade.
Embora indispensável, a questão central é: quem deve arcar com esse custo? Muitas incorporadoras têm repassado esse encargo aos compradores, mas essa prática tem sido considerada abusiva à luz do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O Enquadramento Legal: Por que a Prática é Abusiva
- Código de Defesa do Consumidor (CDC)
O art. 51, IV, do CDC proíbe cláusulas contratuais que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada. A transferência da responsabilidade pela taxa de individualização viola diretamente esse princípio, pois sobrecarrega o comprador com um custo que não deveria ser de sua competência.
A desigualdade de poder entre as partes é evidente. O comprador, muitas vezes leigo em questões jurídicas, adere a contratos pré-elaborados, sem margem para negociação. Nesses casos, cláusulas que repassam o custo da individualização constituem manifesto desequilíbrio contratual.
- Lei de Incorporações Imobiliárias (Lei nº 4.591/1964)
O art. 44 da Lei de Incorporações Imobiliárias é claro ao impor ao incorporador a responsabilidade pela individualização das unidades ao falar que “após a concessão do habite-se pela autoridade administrativa, incumbe ao incorporador a averbação da construção em correspondência às frações ideais discriminadas na matrícula do terreno, respondendo perante os adquirentes pelas perdas e danos que resultem da demora no cumprimento dessa obrigação”. A justificativa é simples: esse custo está intrinsecamente ligado à atividade-fim do incorporador, que é entregar as unidades devidamente regularizadas aos adquirentes. Repassar essa obrigação ao consumidor não encontra respaldo legal.
Precedentes Judiciais: O Que Dizem os Tribunais?
Os tribunais brasileiros têm consolidado o entendimento de que a cobrança da taxa de individualização das matrículas é abusiva. Um exemplo emblemático é a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) no caso 1009829-22.2020.8.26.0152, em que o relator Viviani Nicolau destacou que o custo da individualização deve ser suportado pela incorporadora.
Essa decisão está em consonância com outros julgamentos, incluindo a Ação Civil Pública n. 1057086-53.2017.8.26.0506, que reforça a natureza abusiva desse repasse. Embora decisões em ações civis públicas não tenham efeito vinculante em todos os casos, elas oferecem um parâmetro sólido para futuras demandas individuais.
Por que a Individualização é uma Obrigação do Incorporador?
- Natureza da Atividade
A individualização das matrículas é parte do processo de regularização do empreendimento, um passo essencial para que o incorporador cumpra seu objetivo de entregar unidades habitacionais prontas para uso e comercialização. Como tal, trata-se de um custo inerente à atividade-fim do incorporador.
- Contratos de Adesão e a Imposição ao Consumidor
Nos contratos de adesão, amplamente utilizados no mercado imobiliário, o comprador tem pouca ou nenhuma oportunidade de modificar cláusulas. A imposição da taxa de individualização é um exemplo claro de como essas cláusulas podem ser usadas para repassar custos indevidos ao consumidor, em evidente afronta aos direitos previstos no CDC.
Impactos para o Consumidor e o Mercado Imobiliário
- Sobrecarregar o Consumidor
A transferência desse custo ao consumidor não apenas aumenta as despesas do comprador, mas também compromete a previsibilidade financeira da aquisição. Muitos compradores não estão cientes da cobrança até o momento da entrega das chaves, o que pode gerar inadimplência e conflitos judiciais.
- Efeitos no Mercado Imobiliário
Práticas abusivas, como o repasse da taxa de individualização, prejudicam a confiança dos consumidores no setor imobiliário. Incorporadoras que insistem nessa prática arriscam danos reputacionais e potenciais ações judiciais que podem comprometer sua operação no longo prazo.
Como Evitar Problemas: Dicas para Compradores de Imóveis
- Leia o Contrato com Atenção
Antes de assinar, verifique se há cláusulas que transfiram a taxa de individualização ao comprador. Se identificar essa prática, questione a incorporadora ou consulte um advogado.
- Conheça Seus Direitos
O Código de Defesa do Consumidor e a Lei de Incorporações Imobiliárias estão do lado do comprador. Entenda as proteções legais para evitar ser lesado.
- Busque Orientação Jurídica
Consultar um advogado especializado é essencial para garantir que seus direitos sejam respeitados durante a compra do imóvel.
Conclusão
A cobrança da taxa de individualização das matrículas é um tema sensível e relevante para o mercado imobiliário. Enquanto as incorporadoras têm a obrigação legal de assumir esse custo, muitos consumidores ainda enfrentam práticas abusivas que colocam em risco sua estabilidade financeira.
A solução está em maior transparência nas relações contratuais, na fiscalização por parte dos órgãos competentes e no empoderamento dos consumidores. Se você está planejando comprar um imóvel ou já passou por situações semelhantes, compartilhe sua experiência nos comentários e ajude a ampliar o debate sobre práticas mais justas no setor imobiliário.
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